segunda-feira, 12 de maio de 2014

A VINGANÇA DO PROF. JOSÉ PACHECO E A ESCOLA DA PONTE


Aceitando o convite do Ateliê de educadores, Marcia Nunes compartilha conosco suas reflexões a partir de palestra de José Pacheco, idealizador da Escola da Ponte. Por meio de seu relato, podemos conhecer um pouco da referida proposta.

Marcia Nunes é pedagoga com pós-graduação em Gestão Escolar. Possui formação inicial em Psicologia Clínica, Teologia com  ênfase em Religiões Comparadas e experiência em jornalismo. É autora do livro As Três Mentes, de autoajuda, e escreveu dois livros em coautoria sobre o turismo em Caldas Novas. Alimenta o sitio da Secretaria Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia de Caldas Novas - SEMECT, onde divulga ações da rede municipal de ensino: http://semectcaldasnovas.go.gov.br




Ouvir o Professor José Pacheco funcionou como uma radical quebra de paradigmas na minha formação acadêmica e pessoal. Formávamos um público de 400 pessoas que puderam ouvi-lo no auditório do Conselho Estadual de Educação em Goiânia, capital de Goiás, no final de 2013. O encontro teve o apoio do SINTEGO – Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Goiás, SEPE – Sindicato das Escolas Particulares do Estado de Goiás, e do SESI-SENAC-GO.

A fala do Prof. Pacheco durou 4 horas sem intervalo sequer para beber água ou ir ao banheiro. Por que ninguém ousou interrompê-lo em suas colocações tão inovadoras e provocativas? E por que seus anfitriões permitiram que falasse livremente sobre suas práticas pedagógicas nada convencionais e tão revolucionárias?

José Pacheco é uma figura conhecida internacionalmente no mundo da educação desde que idealizou e coordenou em 1976 a Escola da Ponte em Portugal, seu país de origem, onde nasceu em 10 de maio de 1951. É educador e pedagogo, além de grande dinamizador da gestão democrática na Educação. É especialista em Música, Leitura e Escrita, mestre em Ciências da Educação pela Faculdade de Psicologia pela Universidade de Porto. Assim fez seu nome e montou sua história. Portanto, os ouvintes daquele auditório sabiam de antemão que seriam cutucados a exaustão, como de fato foram.

Começou falando de sua vingança motivadora. “Eu era um projeto que tinha tudo para dar errado: fui um menino pobre, piolhento e zarolho. Na escola vivenciei experiências de sofrimento muito comuns às crianças nas mesmas condições. Mas jurei vingança e, quando adulto, criei a Escola da Ponte”.




É difícil imaginar uma escola sem muros, salas, carteiras enfileiradas, seriação e alunos separados por idades e níveis de conhecimento. Pois bem, na Escola da Ponte e nas aproximadamente 1.000 Comunidades de Aprendizagem (novo nome para Escolas) inspirados por José Pacheco ao redor do mundo e em algumas 100 brasileiras, não existe grade curricular nem personagens como diretor, coordenador pedagógico, professor e menos ainda avaliação.

Nada disso existe na Escola da Ponte, tampouco no Projeto Âncora, uma ONG localizada na cidade de Cotia, interior de São Paulo, que segue o mesmo modelo de ensino da Escola da Ponte. “Grade faz lembrar prisão”, relembrou.

Os estudantes não sentem falta da tal grade e os temas vão fluindo de acordo com as situações problematizadas que vão surgindo no meio da sala, espontaneamente. Algo do tipo: “Por que chamam meu bairro de favela?” De acordo com José Pacheco, a simples busca da resposta para essa pergunta já é suficiente para a construção de um projeto que vai durar o tempo necessário e suficiente até que o assunto seja esgotado. As pesquisas vão se avolumando de tal forma que muito provavelmente alguém deseje ser um arquiteto, um empreendedor social ou quem sabe um engenheiro. Mas isso nem de longe é o mais importante nessas comunidades.

Somente aí os professores se acercam e passam a mediar, conduzir, contornar, moldar, inspirar. Porém, para isso acontecer é necessário adequada preparação, que passa a uma distância de anos luz de teóricos como Vygostsky e Piaget, por exemplo, “dinossauros fossilizados que nem eram professores”.

E cita pelo menos 30 educadores brasileiros condenados ao ostracismo, como Paulo Freire (1921-1997), Eurípedes Barsanulfo (1880-1918), Anísio Teixeira (1900-1971), Tomás Novelino (1901-2000), Agostinho da Silva (1906-1994), entre outros ilustres desconhecidos da grande maioria de nós.

Coordena o Projeto Âncora na cidade de Cotia, interior de São Paulo, enquanto acompanha, inspira e assessora pelo menos 100 Comunidades de Aprendizagem espalhadas em todo o território nacional.


Enfim, a palestra do Prof. Zé Pacheco encerrou com respostas seguras e colocações bombásticas, garantindo que o método adotado em tais comunidades forma estudantes do Ensino Médio prontos para concorrer por vagas em qualquer universidade brasileira qualquer que seja a condição do vestibular. “Quando aprendemos a aprender, nunca mais queremos parar”.

O educador sexagenário, agora aposentado, nem pobre tampouco piolhento, embora continue zarolho, saboreia sua vingança quando observa o alcance do voo dos seus meninos e meninas. Seja aluno, professor ou pais nas Comunidades de Aprendizagem do tio Zé, todos são importantes. “As escolas são as pessoas, e não os lugares. Onde houver gente, há escola. Convidem-me, e mostrarei como”.

Para aprofundar o assunto:
Projeto Âncora - Cotia
Palestra sobre a Escola da Ponte (José Pacheco)
Rubem Alves e a Escola da Ponte

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