Entrevistas


Aceitando o convite  do Ateliê de Educadores, Ana Carla Nunes nos concede uma entrevista a respeito do Turismo Pedagógico, versando sobre conceito, importância para a educação, história desta possibilidade pedagógica, experiências de turismo pedagógico na história moderna e na Bahia contemporânea, seja por iniciativas de pesquisadores ou por meio de disciplinas oferecidas em ambientes acadêmicos. Ana Carla fala também do potencial turístico e pedagógico de Salvador e da Bahia, presente especialmente em todo o seu patrimônio cultural.

Por fim, para os que desejam aprofundar-se no tema, Ana Carla dá uma série de sugestões de leituras.

Ana Carla é turismóloga e pesquisadora sobre festas populares instintas na Bahia. Além disso é blogueira. Entre seus blogs o mais famoso é o http://www.festasdabahia.com/, por meio do qual ela nos conduz por momentos histórico da Bahia.



Ateliê de Educadores: O que é turismo pedagógico?

Ana Carla: São atividades extra-classe, preferencialmente com foco multidisciplinar, em que existe a oportunidade de troca de conhecimento e de exploração pedagógica permitida por esta interação Turismo - Pedagogia, ministradas por um professor que analisa junto com a turma as diversas vivências numa abordagem interativa e lúdica, com foco no efetivo aprendizado dos estudantes.

Ateliê de educadores: Há experiências pioneiras na utilização do turismo com fins pedagógicos?

Ana Carla: Sim, se avaliarmos o histórico do Turismo, os Grands Tours, do século XVI, em que os filhos dos monarcas da época viajavam em busca de conhecimento, já eram atividades pensadas com esta proposta.
Atualmente, com a influência de novas correntes sociais e ideológicas na escola, a disciplina Visitas Técnicas foi criada e ministrada geralmente por professores de Turismo. Em algumas instituições de ensino, por exemplo, inclusive nas graduações, esta disciplina é obrigatória, porque permite o diálogo e a vivência do que é aprendido em sala de aula de forma teórica com o conhecimento in loco, feito por meio de deslocamentos dos alunos até as construções patrimoniais.
Em Salvador, profissionais como Carlos Henrique Cunha, Marinho e Adriana Melo, escrevem sobre o tema e empresas como a Peregrinos da Cultura e Cooptur, com iniciativas ainda tímidas, já criam roteiros com foco neste segmento do turismo.

Ateliê de educadores: Quais seriam as vantagens para esta atividade?

Ana Carla: Estas atividades ampliam o foco dos estudantes para determinados assuntos, permitem com que as escolas saiam do tradicionalismo e pensem em atividades lúdicas e interdisciplinares dentro dos projetos pedagógicos. Mas, sobretudo, além de ser uma atividade que pode ser aplicada em qualquer grau de escolaridade, possibilita uma produção de conhecimento mais efetiva, além da união de teoria e prática, de forma bastante intrínseca, gerando resultados positivos em todo processo de avaliação e aprendizado.

Ateliê de educadores: Que espaços em Salvador poderiam ser ricos para o desenvolvimento desta atividade?

Ana Carla: Aqui em Salvador, se quiséssemos utilizar essa prática pedagógica em disciplinas como, por exemplo, Ciências Sociais, poderíamos pensar em visitas ao Centro Histórico da Cidade. Um outro roteiro bastante trabalhado é a visita a museus que por si só contam a história da formação cultural, étnica, social e religiosa da cidade.

Os Bairros Históricos como o Santo Antonio Além do Carmo são pouco explorados ainda, mas estes, vale lembrar, são responsáveis, inclusive, por manter em seus patrimônios e casarões parte da memória da cidade de Salvador preservada.

Além disso, temos os Fortes, os equipamentos Culturais e Turísticos como, por exemplo, o Mercado Modelo. Fora de Salvador, os Engenhos do Recôncavo Baiano, o Projeto Tamar do Ibama, a Reserva de Sapiranga e outros tantos locais que podem ser bem explorados pedagogicamente e trabalhados em consonância com as ementas dos cursos e disciplinas. Se pensarmos que Salvador foi fundada em 1549 e parte deste passado resiste, esta historicidade seguramente permite roteiros que contemplem informações relevantes e novos conhecimentos; provocações e questionamentos para serem discutidos e mediados pelo professor na atividade proposta e em sala de aula.

Ateliê de educadores: Que profissionais estão habilitados para promover o turismo pedagógico? É possível experiência interdisciplinares?

Ana Carla: O interessante é que um professor que entenda da parte burocrática de elaboração de roteiros pedagógicos, possa mediar estas visitas, juntamente, claro, com os demais professores da turma ou curso, para que a exploração pedagógica da atividade seja trabalhada de forma plena.

Já comprovamos que esta junção de Turismo e Pedagogia permite um trabalho interdisciplinar consistente. A dica que fica é que esta atividade seja pensada em grupo e que, sobretudo, tenha um foco específico voltado às disciplinas envolvidas que, sem sombra de dúvidas, até pelo seu caráter dinâmico e inovador, é possível de acontecer nestas atividades.

Contatos:
Ana Carla Nunes (www.festasdabahia.com)

Algumas Indicações de Leituras:
http://www.festasdabahia.com/2009/12/importancia-do-turismo-pedagogico-nos.html

CALIGHER, Sandra Bianca. Turismo Pedagógico. São Paulo,1998. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Turismo) – Faculdade Ibero-Americana,1998.


CAMPOS, Luiz Cláudio; GONÇALVES, Maria Helena. Introdução a turismo e hotelaria. Rio de Janeiro: Senac Nacional,1998.


LAGE, Beatriz Helena Gelas; MILONE, Paulo César (orgs.). Turismo: teoria e prática. São Paulo : Atlas, 2000.p.71-79.

NSARAH, Marília Gomes dos Reis (org.).Turismo: como aprender, como ensinar2. São Paulo: Senac, 2003.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Prefácio. In: GADOTTI, Moacir. História das idéias pedagógicas. São Paulo : Ática, 1995.p.11.


TRIGO, Luiz Gonzaga Godoi. A sociedade pós-industrial e o profissional em turismo. 4 ed. Campinas, SP: Papirus, 1998.

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Gleide Guimarães, Educadora, Assistente Social e Psicopedagoga, gentilmente atendeu ao nosso convite, dando-nos uma entrevista sobre Psicopedagogia. Por meio dela, poderemos compreender um pouco sobre o papel da Psicopedagogia com relação a aprendizagem, seu objeto de estudo, sua história no mundo e no Brasil e outras informações.
É uma entrevista bastante esclarecedora e útil para quem ainda não conhece suficientemente a Psicopedagogia.

Gleide Moreira Teixeira Guimarães tem ós-graduação Lato Sensu em Psicopedagogia Clínica e Institucional pela Faculdade de Artes do Paraná, é Graduada em Serviço Social pela Universidade Católica do Salvador e tem formação em Pesquisas e Estudos Avançados em Dislexia e TDA-H. Atuou no Programa Nacional de Inclusão de Jovens: Educação, Qualificação e Ação Comunitária, como Educadora de Ação comunitária e no Instituto de Trabalho Dante Pellacani, coordenando projetos de inclusão.

Ateliê de Educadores: O que é Psicopedagogia?
Gleide Guimarães: A psicopedagogia é um campo de atuação em Saúde e Educação que lida com o processo de aprendizagem humana; seus padrões normais e patológicos, considerando a influência do meio, da família, da escola e da sociedade no seu desenvolvimento e utilizando procedimentos próprios. Está pautada numa multiplicidade de áreas de conhecimento, objetivando facilitar o processo de aprendizagem não apenas no ambiente escolar, mas em todos os âmbitos: cognitivo, afetivo e social.


Ateliê de Educadores: Em qual contexto surge a Psicopedagogia?
Gleide Guimarães: Os primórdios da Psicopedagogia historicamente ocorreram na Europa, ainda no século XIX, evidenciada pela preocupação com os problemas de aprendizagem na área médica. Naquela época achava-se que os comprometimentos na área escolar eram provenientes de causas orgânicas, pois se procurava identificar no físico as determinantes das dificuldades do aprendente, vinculada à ação do médico.
O primeiro centro psicopedagógico foi criado em Paris em 1946. Médicos e pedagogos, cooperativamente, faziam um trabalho destinado a crianças com problemas escolares ou de comportamento, isto é, para aquelas que apresentavam doenças crônicas como diabetes, tuberculose, cegueira, surdez ou problemas motores.
Com o objetivo de melhorar a relação professor-aluno surge em 1958, no Brasil, o Serviço de Orientação Psicopedagógica da Escola Guatemala, na Guanabara (Escola Experimental do INEP - Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais do MEC).
A categoria profissional dos Psicopedagogos organizou-se no país com a divulgação da abordagem psico-neurológica do desenvolvimento humano. Sendo assim, a Psicopedagogia nasceu da necessidade de uma melhor compreensão do processo de aprendizagem, tornando-se uma área de estudo específica que busca conhecimento em outros campos e cria seu próprio objeto de estudo. Ocupa-se do processo de aprendizagem humana: seus padrões de desenvolvimento e a influência do meio nesse processo. É conhecida por atender crianças com dificuldades de aprendizagem, porém é fato que tais dificuldades, distúrbios e patologias podem aparecer em qualquer época da vida sendo também, objeto de estudo do psicopedagogo.


Ateliê de Educadores: O que é preciso para ser um psicopedagogo?
Gleide Guimarães: Estarão em condições de exercício da Psicopedagogia os profissionais graduados em 3º grau, portadores de certificados de curso de Pós-Graduação em Psicopedagogia, ministrado em estabelecimento de ensino oficial e/ou reconhecido, sendo indispensável submeter-se à supervisão e aconselhável trabalho de formação pessoal.
A formação do Psicopedagogo, no Brasil, vem ocorrendo em caráter regular e oficial, desde a década de setenta em instituições universitárias. Esta formação foi regulamentada pelo MEC em cursos de pós-graduação e especialização, com carga mínima de 360 horas. Atualmente existem cursos oficiais nos estados: Amazonas, Pará, Bahia, Ceará, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo, Distrito Federal, Sergipe, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
A Psicopedagogia está em vias de regulamentação da profissão, o que permitirá a normatização da formação e exercício profissional, possibilitando estender o atendimento psicopedagógico à população de baixa renda, por meio de convênios de assistência médica e sistemas públicos de saúde e educação.


Ateliê de Educadores: Quando é que devemos recorrer aos serviços de um psicopedagogo?
Gleide Guimarães: A intervenção psicopedagógica tem como objetivo a assistência às pessoas que apresentam dificuldades de aprendizagem, sendo estas geralmente encaminhadas pelas escolas, com o objetivo de esclarecer as causas de suas dificuldades. Essas dificuldades de aprendizagem podem ser causadas por diversos fatores e cabe ao psicopedagogo descobri-las. Sendo assim, o Psicopedagogo deve ser procurado sempre que se perceber alguma dificuldade ou transtorno de aprendizagem, quando o estudante não vai bem no processo de aquisição do conhecimento, tem dificuldades em aprender, tem problemas escolares, é inquieto, desobediente, desinteressado, desatento ou agressivo.
Em geral a dificuldade é percebida quando a Orientadora solicita a presença da família constantemente na escola ou a professora pede ajuda e esse pedido de ajuda está ligado à aprendizagem. Ai então está na hora de procurar um Psicopedagogo.


Ateliê de Educadores: Como é o trabalho do psicopedagogo? O que ele faz?
Gleide Guimarães: O trabalho psicopedagógico pode adquirir caráter preventivo, clínico, terapêutico ou de treinamento, o que amplia a área de atuação, seja ela escolar - orientando professores, realizando diagnósticos, facilitando o processo de aprendizagem, trabalhando as diversas relações humanas que existem nesse espaço; empresarial - realizando trabalhos de treinamento de pessoal e melhorando as relações interpessoais na empresa; clínica - esclarecendo e atenuando problemas; ou hospitalar - atuando junto à equipe multidisciplinar no pós-operatório de cirurgias ou tratamentos que afetem a aprendizagem.
Nosso objeto de estudo é o ser que apreende da realidade e constrói o seu conhecimento aprendendo. Portanto, para nós a aprendizagem é um processo de construção que se dá na interação permanente do sujeito com o meio que o cerca. Estudamos as características dessa aprendizagem: como se aprende, como essa aprendizagem varia evolutivamente e está condicionada por vários fatores, como se produzem as alterações na aprendizagem, como reconhecê-las, tratá-las e preveni-las.
Na Instituição o nosso trabalho é preventivo para evitar o aparecimento de problemas de aprendizagem, transformando a atenção individual em grupal, mobilizando o grupo e resgatando, ressignificando o sujeito e o outro (grupo), analisando os sintomas e considerando as relações que existem na instituição. Está mais voltada para a prevenção dos insucessos relacionais e de aprendizagem, se bem que muitas vezes, devemos considerar a prática terapêutica nas organizações como necessária.
Sendo assim, a Psicopedagogia na instituição e para a instituição não se ocupa exclusivamente de um indivíduo e suas particularidades. Ocupa-se sim do funcionamento geral, do processo e dos resultados do aprender em seu interior e do modo como tudo isto pode estar contribuindo para o aparecimento de dificuldades e/ou facilidades de aprendizagem, isto é, sem desvincular-se da concretude de sua origem, de sua história. O enfoque deixa de ser individual para se tornar social e amplia o âmbito da ação, podendo agir com a instituição ou com grupos que dela fazem parte, sem perder de vista a relação com o todo.
Já em Psicopedagogia Clínica realizamos um trabalho individual e terapêutico, tendo como missão retirar as pessoas da sua condição inadequada de aprendizagem, dotando-as de sentimentos de alta auto-estima e fazendo-as perceber suas potencialidades, recuperando desta forma, seus processos internos de apreensão de uma realidade, nos aspectos: cognitivo, afetivo-emocional e de conteúdos acadêmicos. O atendimento diferenciado pode ir além das questões-problema vinculadas à aprendizagem, podendo trazer à tona, mais facilmente, as razões que desencadeiam as necessidades individuais - às vezes alheias ao fator escola, que fazem com que as pessoas sintam-se excluídas, ou excluam-se a si mesmas do sistema educacional.
Desta forma o psicopedagogo contribui significativamente com todos os envolvidos no processo de aprendizagem, pois exerce seu trabalho de forma numa visão sistêmica, onde todos deverão ter seu “olhar” e sua “escuta” para o sujeito da aprendizagem.
O olhar do psicopedagogo, além de lúcido deve ser esclarecedor, sem julgamentos ou depreciações. Diante de um olhar assim, a aceitação flui naturalmente. E esta aceitação é a condição primeira, a mais necessária para que se inicie o caminho de cura, aliando a teoria à prática.
Concluindo, entre outras coisas, a Psicopedagogia pode levar o sujeito com dificuldades de aprendizagem a descobrir um novo espaço, um novo jeito de se relacionar com sua modalidade de aprendizagem, levando-o ao desejo de aprender e conseqüentemente favorecendo o seu processo de aprendizagem.


Ateliê de Educadores: Qual a relevância do trabalho de um psicopedagogo?
Gleide Guimarães: É importante ressaltar a psicopedagogia como uma ciência nova que muito tem contribuído para explicar a causa das dificuldades de aprendizagem, pois tem como objetivo central de estudo o processo humano do conhecimento: seus padrões evolutivos normais e patologias bem como a influência (família, escola, sociedade) no seu desenvolvimento (Scoz, 1992; Kiquel, 1991)
A psicopedagogia, por contar com a contribuição de várias áreas do conhecimento, Psicologia, Sociologia, Antropologia, e outros, assume o papel de desmistificadora do fracasso escolar, entendendo o erro apresentado pelo indivíduo no processo de construção do seu conhecimento (Piaget), a as interações (Vygotsky), como fator importante no desenvolvimento das habilidades cognitivas. Sendo assim, o psicopedagogo assume papel relevante na abordagem e solução dos problemas de aprendizagem. Não lida diretamente com o problema, lida com as pessoas envolvidas. Lida com o aprendente, com os familiares e com os professores, levando em conta aspectos sociais, culturais, econômicos e psicológicos.
Percebo que a Psicopedagogia também tem papel importante na inserção e manutenção dos alunos com necessidades educativas especiais, comumente chamada inclusão. Entendo que colocar o aluno com necessidades educativas especiais em sala de aula e não criar estratégias para a sua permanência e sucesso escolar inviabiliza todo o movimento nas escolas. Nesse sentido, faz-se premente a necessidade de um acompanhamento e estimulação destes estudantes para que as suas aprendizagens sejam efetivas.
O trabalho do psicopedagogo é terapêutico e centrado na aprendizagem, mas levando-se em consideração o aprendente como um todo, seu meio e suas relações, cabendo a ele, em primeiro lugar, estabelecer um vínculo positivo com o aprendiz, a fim de proporcionar o resgate do prazer de aprender.


Para aprofundar-se no assunto

Livros:
BEAUCLAIR, João. Para Entender Psicopedagogia: Perspectivas atuais desafios futuros. Wak: Rio de Janeiro, 2006.
BOSSA, Nádia. Um Diálogo Entre a Psicopedagogia e a Educação. Curitiba: Bolsa Educacional do Livro, 2008.
BARBOSA, Laura Monte Serrat. A Psicopedagogia no Âmbito da Instituição Escolar. Curitiba: Expoente, 2001.
ANDREOZZI, Maria Luiza. Piaget e a Intervenção Psicopedagógica. São Paulo: Olho D’Água, 2007.
FERNANDÉZ, Alícia. Uma Mulher Escondida na Professora. Porto Alegre: Artmed, 1994.
PITOMBO, Elisa Maria & Pugliese, Ana Lúcia. Estudo sobre o aprendizado escolar. Psicopedagogia, um portal para a inserção social. Petrópolis: Vozes, 2003.


Filmes:
“Como Uma Estrela na Terra – Toda Criança é Especial” do diretor/ator Aamir Khan;
“Elefante”, filme do diretor Gus Van Sant;
“Gaby - Uma História Verdadeira” do diretor Luis Mandok;
“Em Busca da Terra do Nunca” do diretor Marc Forster.

Sites:

Tomei conhecimento deste último SITE no Blog Ateliê de Educadores de Francisco Sales Cunha Neto na publicação: uma reflexão de Bárbara Cerqueira sobre estratégias para a formação de leitores escolares. Ao clicar na dica: TEXTO PARA TODAS AS IDADES, não só fiquei deliciada com as indicações de livros literários como, fuçando o “Educar para Crescer”, descobri muito material bom para usar em avaliações e intervenções psicopedagógicas. É um sucesso, criativo, diversificado, atraente e atual.
Gleide Moreira Teixeira Guimarães - ABPp 707


 

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O Ateliê de Educadores inaugura a página "Diálogos", entrevistando a professora Thalita Araújo sobre Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS, surdez, inclusão de surdos na educação, dentre outros assuntos.
Thalita Araújo é Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Graduanda do curso de Bacharelado em Letras/Libras pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Certificada pelo Ministério de Educação e Cultura (MEC) como instrutora de Libras em nível superior. Certificada pelo MEC como tradutora intérprete de Libras-Português e Português-Libras em nível médio. Professora dos cursos de Licenciatura em Música e de Pedagogia da Faculdade Evangélica de Salvador (FACESA). Tradutora Intérprete de Língua de Sinais (TILS) da Escola Estadual Wilson Lins.
Esperamos que este diálogo colabore com o aprofundamento dos temas relacionados, desperte interesse por novas pesquisas e estimule o envolvimento na luta pela inclusão de surdos na educação e na sociedade. 


Ateliê de Educadores: O que é LIBRAS?
Thalita Araújo: Costumo fazer uma pequena brincadeira com as pessoas que me fazem essa pergunta, devolvendo a elas a mesma pergunta: para você o que significa Libras?
Para ajudar, posso dar duas opções de resposta:
a) Linguagem Brasileira de Sinais;
b) Língua Brasileira de Sinais.
Já fez sua escolha? Se ainda não a fez posso dar uma ajudinha a mais. Vejamos os conceitos de língua e linguagem de acordo com o dicionário Aurélio:
Língua é o “conjunto das palavras e expressões usadas por um povo, por uma nação, e o conjunto de regras da sua gramática; idioma”.
Linguagem é “tudo quanto serve para expressar idéias, sentimentos, modos de comportamento etc. (...)”.
E agora, já conseguiu escolher entre “a” e “b”? Bom, se você escolheu a letra “a” você não acertou! Pois é, muitas pessoas acreditam que a Libras é uma linguagem, mas ela contém todos os atributos de uma língua, inclusive uma gramática com estudo da sintaxe, morfologia, fonologia, pragmática, dentre outros.
Usualmente as pessoas também chamam a Libras de “a língua do surdo” e desta vez não há engano! A Libras é sim a língua natural das pessoas surdas, isso quer dizer que mesmo que um surdo aprenda a falar a língua oral do seu país, sempre vai ter mais facilidade na compreensão do mundo usando a língua de sinais!
É interessante informar também, que existem diversas línguas de sinais em todo mundo, no caso do Brasil, a Língua Brasileira de Sinais.

Ateliê de Educadores: Pode-se dizer que uma pessoa surda também é muda? Porquê?
Thalita Araújo: Não! E um “não” bem enfático!! Pois a maioria dos surdos não se agradam com esta nomenclatura. Já vi alguns surdos fazendo comparações do tipo “você gostaria que te chamassem de ‘ouvinte-mudo?!’”
Parece até engraçado ver uma frase dessas, mas é coerente no pensamento de uma pessoa que pode comunicar-se livremente por meio de sua língua e além disso, pode desenvolver a oralidade por meio de treinamento vocal com fonoaudiólogos, pois seu aparelho fonador na maioria das vezes está em perfeito estado, e ainda assim é chamado de “mudo”!
Explicando melhor ser surdo não implica em diretamente ser mudo. E na realidade a mudez é uma deficiência rara, provocada por fatores usualmente externos, como um acidente ou um trauma. Então, para não errar, vamos chamar essas pessoas que não ouvem apenas de surdos ou pessoas surdas!

Ateliê de Educadores: Toda pessoa surda conhece LIBRAS?
Thalita Araújo: Infelizmente não. A Libras ainda está em processo de difusão e por não ser conhecida e usada pela maioria das pessoas ouvintes, os surdos que nascem em lares de pais ouvintes, que é o caso da grande maioria, não tem a oportunidade de aprender a Libras em ambiente domiciliar e principalmente na idade correta de aquisição de linguagem que é até os cinco anos. Desta forma, os surdos que não adquirem a Libras de forma natural terão de aprendê-la em outros ambientes.
Comumente a escola está relacionada ao papel da interação e desenvolvimento lingüístico das crianças, principalmente durante a educação infantil, e com as crianças surdas isso se torna ainda mais importante quando pensamos que este será o seu primeiro ambiente de aprendizagem de uma língua em se tratando de uma escola especifica para as necessidades das pessoas surdas (ou escola de surdos).
Outro local apropriado para o desenvolvimento lingüístico da criança surda são as associações de surdos, onde os pais também podem obter informações sobre as comunidades surdas, sobre a cultura e identidade surda. Além de terem a oportunidade de por meio de cursos e interação com surdos adultos, aprenderem a Libras para continuarem estimulando seus filhos em casa.
Porém, é comum encontrar surdos (principalmente os que moram no interior) que mesmo na fase adulta não conhecem a Libras em seu sentindo formal. Eu disse “formal”, pois por serem surdos eles naturalmente irão desenvolver uma língua gestual que neste caso pode ser chamada de língua caseira, que apenas seus familiares e amigos próximos irão conhecer.

Ateliê de Educadores: Se não soubermos utilizar LIBRAS, há outras formas de nos comunicarmos com pessoas surdas?
Thalita Araújo: Sim! Basta usar um pouquinho a imaginação e a criatividade! É claro que saber a Libras tornará o contato com a pessoa surda muito mais agradável (pense em como seria conversar com um alemão sabendo apenas rudimentos de sua língua?), mas existem diversas estratégias para não desistir de conversar com um surdo. A que normalmente é mais pensada e usada é a escrita, mas se já sabemos que a Libras é outra língua, devemos compreender que a sua escrita também obedece a outras regras que não as da língua portuguesa, por exemplo. E por assim ser, a escrita da pessoa surda é diferenciada, e por isso sua leitura um pouco limitada. Mas ainda assim é possível comunicar-se com uma pessoa surda por meio da escrita, basta que este surdo consiga interpretar de forma satisfatória a leitura.
Uma outra forma muito interessante e um pouco engraçada é a mímica. A expressão facial e corporal é um dos parâmetros da Libras e por isso expressar-se por meio de gestos e expressões é satisfatório na comunicação com pessoas surdas. E outra forma mais limitada é a indicação de objetos e pessoas com o uso do dedo indicador.Além de tudo isso é usar e abusar da criatividade, com desenhos, imagens, dentre outros.

Ateliê de Educadores: Onde e como podemos aprender LIBRAS?
Thalita Araújo: A forma mais fácil e simples de aprender Libras é por meio da interação com pessoas surdas, sem medo e sem preconceito. Mas em todo Brasil são oferecidos cursos de Libras que são didaticamente divididos em três níveis: básico, intermediário e avançado. Pode-se encontrar cursos de Libras nas associações de surdos, em formatos de cursos de extensão em diversas faculdades e universidades e nos CAS (Centro de Apoio as pessoas Surdas) em todo Brasil, sendo que estes costumam ser gratuitos! Além destes espaços um local muito comum (onde inclusive eu tive o meu primeiro contado com a Libras) são as igrejas, tanto as católicas como as evangélicas de uma forma geral (não cito outras religiões, pois pessoalmente nunca vi trabalhos com surdos em outros locais que não os já citados).
Ressalto que o aprendizado de uma língua é sempre contínuo, então fazer um curso (mesmo que os três níveis) não garante a proficiência na língua, mas o convívio com pessoas surdas usuárias da Libras sim!

Ateliê de Educadores: O que é preciso para ser intérprete de LIBRAS?
Thalita Araújo: Para ser TILS (Tradutor Intérprete de Língua de Sinais) é necessário muito mais que saber a Libras, é preciso ser proficiente e ter capacidade de transpor o significado de uma língua para a outra de forma simultânea.
Antes da Lei de Libras (10.436/02) e do decreto que a regulamenta (5626/05) existiam cursos, em nível técnico e muitas vezes não formais, que preparavam a pessoa para atuar como TILS. Além destes cursos muitas pessoas que haviam aprendido Libras de forma informal a partir da necessidade dos sujeitos surdos em diversos locais, principalmente as igrejas tornavam-se intérpretes. Nestas, as pessoas ouvintes estabeleciam um contato mais regular com os surdos.
Após a promulgação da Lei e do Decreto citados, começou a haver uma maior exigência na formação destes profissionais . Para os que já atuavam como TILS foi criado o Exame Nacional de Certificação em Proficiência na Libras, ProLibras, que assegura aos profissionais TILS a sua proficiência e certificação para atuação em diversos espaços e níveis da escolaridade. Para as pessoas que pretendem ser TILS desde então, existe a em Letras/Libras que assegura esta formação. O Letras/Libras é oferecido com curso de licenciatura e bacharelado, o segundo comporta a formação do TILS.

Ateliê de Educadores: Como está hoje a inclusão de surdos em escolas regulares brasileiras? Há legislação para isso?
Thalita Araújo: Essa é uma pergunta um tanto complicada para a maioria das pessoas da área de educação de surdos. Por quê? Pois entendemos que a inclusão, principalmente nas séries iniciais, comumente não funciona para as pessoas surdas. Explico. Vamos pensar novamente em uma criança ouvinte que nasce num lar de pais ouvintes, como ela aprende a falar? Obviamente ao ouvir a repetição de, p. ex., “ma, ma, ma, mamãe”, um dia a criança irá pronunciar “mamãe” e a casa se encherá de alegria! Mas agora pensemos num lar de uma criança surda, que na grande maioria das vezes nasce no lar de uma família ouvinte. Como esta criança irá obter o aprendizado de uma língua se seus pais possuem uma língua oral-auditiva e o mesmo percebe o mundo de forma visual?!
Uma boa saída seria freqüentar uma escola de surdos, onde ela pudesse ter como referencial lingüístico um adulto preferencialmente surdo proficiente na Língua de Sinais. Uma outra estratégia é freqüentar as associações de surdo da sua cidade local. Porém, temos que pensar que o espaço da associação, por mais que esteja aberto a comunidade surda de uma forma geral, não é um espaço de educação formal. E o contato com a língua na escola seria diário.
Então defendo, particularmente, uma escola de surdos que ofereça pelo menos a educação infantil e o ensino fundamental, que trabalhe com a perspectiva bilíngüe (considera a Língua de sinais como primeira língua e a língua local, no nosso caso o português, como segunda língua), que tenha professores surdos e ouvintes proficientes na língua de sinais e que ofereçam um espaço linguisticamente favorável à aquisição da Libras como primeira língua.
Ok, eu sei que ainda não respondi a pergunta, mas propositalmente eu aproveitei este espaço para falar um pouco sobre como podemos pensar a educação das pessoas surdas. Quanto à inclusão de surdos... bom, posso falar da realidade em que vivo que é a do estado da Bahia e da cidade de Salvador e, aqui, segundo reportagem recente (22 de março) do Jornal A Tarde, temos 595 pessoas surdas incluídas em escolas estaduais por toda Bahia, sendo que 4 estão em Salvador e 95 surdos em escolas municipais. Posso falar um pouco sobre as escolas estaduais, pois atuo em uma delas num contrato de PST.
Desde o ano passado a Secretaria de Educação Especial do Estado da Bahia tem contratado Instrutores surdos de Libras e TILS para apoiar a inclusão das pessoas surdas. Sei que o número de contratados ainda não é suficiente para cobrir toda rede, mas vejo nesta iniciativa um grande pontapé para que em poucos anos haja concursos públicos na área. Podemos dizer também que a inclusão das pessoas surdas não se resume a colocar TILS em sala de aula e Instrutores surdos numa sala de apoio. Eu acredito que se faz necessário uma sensibilização em toda comunidade escolar, incluindo a oferta da Libras para educandos, educadores e toda comunidade escolar.


Sugestão de leituras

  • Lei 10436/02 - http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/lei10436.pdf

  • Decreto 5626/05 - http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/96150/decreto-5626-05

  • O site da editora Arara Azul disponibiliza diversos livros e outras publicações referentes a área da Educação de Surdos, vale a pena visitar e baixar os materiais! - http://www.editora-arara-azul.com.br/Ebooks.php

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