quarta-feira, 21 de setembro de 2011

(Auto)biografia e História da Educação

ALGUMAS IDEIAS
A escrita (auto)biográfica é uma das experiências que proponho aos estudantes de Licenciatura em Pedagogia, na disciplina História da Educação.
É muito interessante perceber as reações dos estudantes no momento em que apresento a proposta: uns ficam empolgados, outros temerosos. O estranhamento é muito comum, pois alguns estudantes não compreendem ainda que as suas histórias são relevantes para a compreensão de contextos e acontecimentos históricos. Eles, às vezes, não se vêm enquanto sujeitos históricos. Para alguns, sujeitos históricos seriam "os grandes personagens da história", os reis, as rainhas, os generais,  artistas de destaque... enfim, pessoas da elite. Essa concepção é bem própria do ensino tradicional de história, influenciado pela perspectiva positivista.
Ao propor a escrita (auto)biográfica, buscamos estimular o reconhecimento da importância de cada ser humano no mundo,  isto é, do significado de nossas ações e da capacidade que temos de mudar o mundo por meio delas. Vivenciando experiências como essa, os estudantes podem compreender e desenvolver a dimensão do  "ser cidadão," percebendo-se sujeito histórico. Durante um semestre letivo, os estudantes refletem sobre a História da Educação, das comunidades primitivas à contemporaneidade. Nesta última etapa, analisam temáticas da educação a partir de suas histórias de vida. Nesse sentido, sempre digo aos mesmos que, por meio de nossas histórias refletimos a história de uma sociedade, num determinado tempo e espaço. Para isso, nos apoiamos em Moura, quando ele reflete que:

Há muito tempo(...) o método (auto)biográfico tem se mostrado como opção e alternativa às disciplinas das ciências humanas, para fazer mediação entre a história individual e a história social, visto que, segundo Ferraroti (1988, p. 24) “o seu caráter essencial, é a sua historicidade profunda, a sua unicidade”. Ao afirmar que toda práxis humana é reveladora das apropriações que os indivíduos fazem das relações e das próprias estruturas sociais, o referido autor defende que “podemos conhecer o social a partir da especificidade irredutível de uma práxis individual” (...). (MOURA, 2004, p. 126).

Nossas histórias, histórias de homens e mulheres comuns, trazem consigo, portanto, uma historicidade profunda. São elas testemunhos subjetivos de práticas educacionais, baseados, por sua vez, em concepções de educação. A (auto)biografia hoje, por esse motivo, é valorizada pelos historiadores enquanto fonte reveladora da cultura escolar.

Pesquisadores, em geral, e historiadores, em especial, têm manifestado interesse por fontes autobiográficas. Antônio Viñao (2000) observou sua importância para a história da educação, pois permitem examinar a cultura escolar, a percepção que os professores tinham de si mesmos, o universo da alfabetização e da leitura, a profissionalização docente, a gênese e evolução das disciplinas e o currículo escolar, por exemplo. (MIGNOT, 2003, p. 135-136).

Durante e após o processo de construção das (auto)biografias (com foco na educação), os estudantes falam sobre seus sentimentos, revelando que a escrita autobiográfica, assim como aponta Abrahão (2004), proporciona aos autores a autocompreensão.

As (auto)biografias são constituídas por narrativas em que se desvelam trajetórias de vida. Esse processo de construção tem na narrativa a qualidade de possibilitar a autocompreensão, o conhecimento de si, àquele que narra sua trajetória. (ABRAHAO, 2004, p. 203).

Para mediar a elaboração de (auto)biografias - digo (auto)biografias para abrir duas possibilidade de escrita: o autor pode escolher entre escrever sua história ou a história da educação de alguém de seu convívio  - inicialmente desenvolvo uma série de estratégias de sensibilização. Nesse sentido: 1. Apresento a proposta de construção da (auto)biografia enquanto uma das atividades da disciplina; 2. Estimulo uma discussão teórica sobre (auto)biografia; 3. Compartilho histórias (auto)biográficas de ex-alunos ou de outros autores, por meio weblogs, impressos ou leituras em sala de aula.
Após a sensibilização, orientamos a escrita (auto)biográfica, a partir de uma sequência didática que elaboramos e apresentamos aos estudantes. Além disso, oferecemos algumas dicas metodológicas, visando nortear ainda mais a produção.

SEQUÊNCIA DIDÁTICA PARA A ELABORAÇÃO DE UMA (AUTO)BIOGRAFIA
A. Momento individual
+ Recordar algumas histórias de sua vida relacionadas à educação;
+ Dar títulos às histórias que você lembrou;
+ A partir desse conjunto de histórias, criar um título para a (auto)biografia;
+ Escolher a história que você considera mais interessante e compartilhar com o grupo
.

B. Momento coletivo*
+ Compartilhe sua história num pequeno grupo;
+ Depois de narradas todas as histórias, escolha com seu grupo a que mais chamou a atenção de todos e elabore com seus colegas uma apresentação criativa.


* A partir desse momento queremos proporcionar aos estudantes uma noção sobre a produção da (auto)biografia, especialmente quando forem compartilhadas das histórias da educação de vários integrantes do grupo.

C. Momento individual
+ Crie um projeto* para a elaboração da (auto)biografia;
+ Inspirado nas histórias que foram apresentadas em sala de aula, revisar sua proposta inicial de (auto)biografia (você pode acrescentar novas histórias, retirar outras);
+ Inicie a escrita das histórias recordadas por você. Utilize a narração.
+ Apresente aos colegas as suas primeiras anotações. Eles poderão dar dicas no sentido de enriquecer o seu trabalho. O professor também pode te auxiliar nesse sentido.
+ Entregue, no prazo estabelecido pelo professor, a sua autobiografia. Procure formatá-lo de acordo com as normas da ABNT.

RECOMENDAÇÕES PARA A ELABORAÇÃO DA (AUTO)BIOGRAFIA
01. Procure, ao escrever a (auto)biografia, não se preocupar com uma narrativa cronológica. Exemplo: construir um relato que vai do nascimento aos dias atuais;

02. Apresente aquelas histórias que você pode narrar, sem se sentir exposto. Você não precisa dizer tudo a respeito de sua história. Aquilo que não achar conveniente narrar, guarde para si;

03. Peça para outras pessoas participarem da escrita (auto)biográfica, dando depoimentos a respeito dessas histórias, caso elas tenham participado das mesmas. Estas pessoas também podem colaborar com fotografias e outros documentos históricos;

04. Enriqueça sua autobiografia com fotografias e outros documentos que possam ilustrar suas histórias;

05. Lembre-se que o foco da (auto)biografia é a história da educação e que educação não se restringe ao que você vivenciou na escola. Considere, portanto, a educação formal e a educação informal, isto é, experiências educativas vivenciadas por você em vários espaços sociais: escola, família, igreja, partidos políticos, sindicatos, ambientes de trabalho, grupo de amigos, dentre outros;

06. Não deixe para escrever a (auto)biografia na véspera da entrega deste trabalho. Comece a escrever agora, à medida que as recordações a respeito vierem à sua mente;

07. Para facilitar a produção desse material, elabore um pequeno projeto (auto)biográfico. De certa forma, você já começou a fazer isso quando sugerimos que registrasse algumas de suas recordações a respeito de sua história da educação.

*No projeto (Auto)biográfico você deverá:
+ Informar o título da (auto)biografia (Capa);
+ Relacionar os títulos das histórias que recordou e intitulou (Sumário);
+ Descrever o método que irá utilizar para escrever a (auto)biografia, como: escreverá apenas a partir de suas recordações? Contará com a colaboração de amigos e familiares por meio de entrevistas e depoimentos? Utilizará fotografias, documentos diversos, músicas e poesias que marcaram suas histórias da educação?
+ Montar um pequeno cronograma relacionando as ações que precisam ser realizadas para a elaboração da autobiografia e estabelecer prazo para que cada uma seja desenvolvida;
+ Indicar referências bibliográficas, caso sejam utilizadas;
+ Reunir todas essas informações num projeto e entregá-las ao educador no prazo estabelecido.


Referências
ABRAHÃO, Maria Helena Menna Barreto. Pesquisa (auto)biográfica: tempo, memória e narrativas. In: _________. A aventura (auto)biográfica: teoria e prática. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.

MIGNOT, Ana Chrystina Venâncio. Em busca do tempo vivido: autobiografias de professoras. In: MIGNOT, Ana Chrystina Venâncio; CUNHA, Maria Tereza Santos. Práticas de memória docente. São Paulo: Cortez, 2003.

MOURA, Eliana Perez Gonçalves de. Da pesquisa (auto)biográfica à cartografia: desafios epistemológicos no campo da psicologia. In: ABRAHÃO, Maria Helena Menna Barreto. (Org.). A aventura (auto)biográfica: teoria e prática. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.

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