O Ateliê de Educadores tem a satisfação de contar com a colaboração de Hilário Ferreira. O mesmo compartilha conosco uma reflexão sobre a produção eurocêntrica do conhecimento. Atualmente é Professor da Faculdade Ateneu,
graduado em Ciências Sociais e Mestre em História Social pela UFC. Por
compreender que temos que desconstruir as referencia negativas sobre a história
do povo negro hoje atua também como pesquisador da Cultura e História do Negro
no Ceará. Autor do livro Catirina, minha
nêga, tão querendo te vendê...": escravidão, tráfico e negócios no Ceará
do século XIX (1850-1881). Fortaleza : SECULT/CE, 2011.
Boa leitura!
Estamos próximos de completar 13 anos que esta lei 10639/03
foi sancionada pelo presidente Luis Inácio Lula
da Silva e não vemos nenhuma ação concreta por parte do governo do Estado do
Ceará e das autoridades municipais, em especial, de Fortaleza, em criar uma
política séria de implantação dessa lei. Essa lei que versa
sobre o ensino da história e cultura afro-brasileira e africana, ressalta a
importância da cultura negra na formação da sociedade brasileira. Infelizmente,
as autoridades de alguns Estados e municípios (incluindo o nosso - Fortaleza - CE) ainda não
levaram muito a sério e nem consideram importante implantar a mesma.
Considero essa uma situação muito séria, pois o
objetivo da lei é possibilitar aos alunos negros e não-negros, a desconstrução
da versão oficial historicamente construída, sobre a incapacidade do continente
africano de ter produzido cultura. Portanto, de ter uma história. A incapacidade
de perceber a relevância da implantação dessa lei em nossas instituições
educacionais faz com que o povo negro cearense continue pagando um preço
altíssimo numa sociedade marcadamente racista como a cearense.
As instituições educacionais como as Universidades,
Faculdades e escolas foram em parte responsáveis por esse silêncio. Através da
criação de livros didáticos, tornaram-se responsáveis por uma produção e
reprodução de visões equivocadas e preconceituosas sobre negros e índios. Os
currículos escolares se limitaram a falar destes povos somente durante um
período específico de nossa história: o Colonial e o Imperial. Era como se a
história e a cultura dos negros e índios fossem coisas do passado. E de um
passado bem distante. “O saber permanece ligado a um poder que o autoriza...se
os procedimentos científicos não são inocentes, se seus objetivos dependem de
uma organização política, o próprio discurso da ciência deve admitir uma função
que lhe é concedida por uma sociedade: ocultar o que ele pretende mostrar” (1)
Durante longas
décadas uma história oficial do Ceará se responsabilizou de tornar negros e
índios ausentes de grande parte dos acontecimentos que marcaram a nossa
história. E mais, formou várias gerações de brasileiros a partir de uma
perspectiva da história que simplesmente silenciou e criou estereótipos sobre
negros e índios.
Portanto,
acredito que a educação enquanto base de formação de um povo, onde se
estruturam seus modos de pensar e agir, tornou-se, um instrumento de controle e
poder, quando usados da forma acima discutido. Aceitando esse argumento observo
que historicamente a produção do conhecimento no Brasil foi hegemonicamente
eurocêntrica, ou seja, o povo brasileiro e conseqüentemente o cearense, foi
condicionado em sua formação a perceber o mundo em que vive apenas por uma
visão de mundo - a do europeu.
Na verdade
desde que foi abolida a escravidão no Brasil, o que assistimos é a educação
sendo utilizada como um instrumento de controle e subjugação do povo indígena e
negro, na medida em que os acorrentam a um padrão educacional branco, europeu,
que os marginalizam. O que se conheceu (e em algumas escolas ainda predomina) foi
um currículo escolar alienante, produto de uma história forjada pelos
vencedores, pela civilização que impôs seu domínio político, econômico e
cultural – a civilização branca ocidental.(2) Por
isso, a importância de se pensar um currículo multicultural.
Notas
(1) “A Beleza do morto” em
CERTAU, Michael de. A cultura do plural.
Tradução: Enid Abreu Dobraánszky- Campinas, SP: Papirus, 1995.-(Coleção
Travessia do século). Pág. 58.
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